O meu nome é Jonathan e já tenho mais de cinquenta anos. Vivo numa pequena aldeia nas montanhas, onde a vida é simples: trabalho na quinta, caça, pesca. Mas a minha principal companheira sempre foi a minha égua — uma égua velha e inteligente chamada Bella. Ela foi-me dada pelo meu pai, e eu costumava brincar que ela conhecia aquelas montanhas melhor do que eu.
Bella sempre foi calma, equilibrada e obediente. Durante anos, percorremos os mesmos caminhos e nunca tivemos problemas. Eu confiava mais nela do que no GPS, porque ela encontrava o caminho sem erros no nevoeiro, na escuridão e até mesmo durante uma tempestade.
Certa manhã, eu me preparei para ir à aldeia vizinha — precisava levar leite e buscar alguns produtos. O dia estava claro, o céu limpo, nada de anormal. Eu montei Bella e segui pela trilha da montanha, que conhecia como a palma da minha mão.
Mas, depois de algumas centenas de metros, aconteceu algo que eu não poderia prever. Bella parou.
Puxei levemente as rédeas, dei-lhe um estímulo — nenhuma reação. Ela bufou e ficou teimosamente parada no lugar. Suas orelhas se moveram, suas narinas se dilataram, como se ela tivesse sentido algo.
— Vamos lá, velha — murmurei — sempre passamos por aqui.
Mas, em vez de seguir em frente, Bella recuou bruscamente, depois para o lado. Os seus olhos brilhavam de ansiedade. Ela até se empinou, algo que eu nunca tinha visto antes.
Eu estava irritado. Eu precisava seguir em frente, o tempo era curto. Eu estava acostumado a confiar na lógica, não nos instintos animais.
Mas naquele momento algo dentro de mim parou. Havia algo mais do que capricho no seu olhar. Era como se ela estivesse a tentar dizer: «Não vá por aí».
Desisti e decidi contornar o local por outro caminho, mesmo que isso acrescentasse uma hora extra à viagem. Fiquei resmungando o tempo todo: «Do que você está com medo? De pedras? De arbustos?»
Chegámos à aldeia. Tudo correu como de costume. Mas à noite, quando regressava, ouvi as notícias.
Naquela parte do caminho onde Bella se recusou a ir, houve um desabamento. Uma enorme massa de pedras desceu exatamente na hora em que deveríamos estar lá.
Fiquei paralisado. Se Bella tivesse me obedecido, estaríamos bem debaixo dos pedregulhos. Acariciei sua crina e sussurrei: «Você me salvou, velha. Você me salvou».
Mas a história não terminou aí.
Alguns dias depois, decidi ir até lá a pé. Queria ver com meus próprios olhos o local do deslizamento. A estrada estava bloqueada, as pedras ainda não tinham sido removidas e, entre os escombros cinzentos, algo brilhou ao sol.
Inclinei-me e apanhei um pequeno objeto. Era uma velha bússola de cobre. Gasta, mas ainda funcionava. Na tampa estavam gravadas as iniciais «J.H.».
O meu coração deu um salto. Essas iniciais coincidiam com o nome do meu pai — Joseph Harper.
O facto é que, muitos anos atrás, o meu pai desapareceu nessas mesmas montanhas. Ele saiu a cavalo e não voltou. Procuramos por ele durante semanas, mas só encontramos a sela partida. O seu desaparecimento permaneceu um mistério.
E agora, depois de tantos anos, foi Bella quem me parou no local onde eu apanhei a bússola com as iniciais dele.
Eu estava com a bússola nas mãos e sentia o corpo todo a tremer. Os pensamentos se confundiam. Seria coincidência? Ou Bella lembrava-se do cheiro, lembrava-se das pegadas que eu nunca veria?
À noite, demorei muito tempo a adormecer. Mantive a bússola ao meu lado e lembrei-me do meu pai. Ele sempre dizia: «Confia no cavalo, filho. Ele sente o que tu não compreendes». Na altura, parecia-me uma frase engraçada. Mas agora…
Repetia mentalmente os acontecimentos daquele dia. Se Bella tivesse seguido em frente, eu teria sido esmagado pelas pedras. Mas então eu nunca teria encontrado esta bússola. Afinal, ela não só salvou a minha vida, como também me devolveu um pedaço do meu pai.
Na manhã seguinte, pendurei a bússola em minha casa, ao lado da fotografia dos meus pais. E quando me aproximei de Bella, ela olhou para mim com os mesmos olhos inteligentes. E eu percebi: ela guarda muito mais segredos do que eu posso imaginar.
E sabe o que é mais estranho? Desde então, sempre que passo por aquela estrada, a Bella volta a parar. Exatamente no mesmo lugar. É como se ela estivesse à espera de algo. Ou de alguém.
E todas as vezes sinto um frio no estômago: será que ali, entre as pedras, ficou mais uma verdade que ainda não estou pronto para descobrir?

